Diversidade na Prática da Educação em Direitos Humanos - Educar e Acolher a Comunidade LGBTQIAPN
Este artigo apresenta um relato de experiência comunidade LGBTQIAPN+.

Prezados(das) colegas educadores e educadoras, me dirijo a vocês neste momento como uma professora que se afirma como uma mulher, lésbica e oriunda das classes periféricas e que já sofreu em sua jornada como estudante e professora diversos preconceitos dentro e fora do ambiente escolar e, por tanto, sei as dores que atravessam alguns grupos marginalizados em nossa sociedade. Sabemos que o espaço escolar tem um papel fundamental segundo Louro (1999) para refletir e superar as práticas de distinções e desigualdades, assim como a produção de preconceitos e discriminações. Por isso, quero convidá-los/las a uma reflexão urgente e necessária para a nossa práxis pedagógica que é o acolhimento e a efetivação do direito a educação dos alunos e das alunas que são da comunidade LGBTQIAPN+.
Lecionando há mais de 10 anos em instituições públicas e privadas posso afirmar que infelizmente a realidade de lésbicas, gays, os/as bissexuais, os/as transgêneros, os/as queer, os/as intersexuais, os/as assexuais, os/as pansexuais e os/as não binários ou seja, sujeitos que compõe a comunidade conhecida pela sigla LGBTQIAPN+ e que são tratados em nossa sociedade e também, dentro das escolas brasileiras como sujeitos subalternos/as e invisibilizados/as e por isso, estereotipados/das como seres abjetos que existem e resistem dentro e fora do ambiente escolar, uma vez que a educação um direito constitucional para todos e todas, nega a esses corpos o direito de existir e apreender respeitando sua identidade e expressão de gênero. Essa realidade foi agravada a partir do ano de 2015, quando ganhou força no cenário nacional um discurso problemático e mentiroso de “ideologia de gênero” que apareceu em textos escritos pela Igreja Católica a partir da década de 1995 como crítica ao uso do termo “gênero” feito pela ONU em várias conferências pelos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres. Dessa forma, alguns grupos de católicos e de evangélicos começaram a pregar segundo Furlani (2016, p.3) “o perigo de ensinar gênero e sexualidade para as crianças”.
O discurso falacioso sobre a chamada "ideologia de gênero" não apenas distorce o propósito da educação inclusiva, como também viola direitos fundamentais garantidos pela Declaração Universal dos Direitos Humanos e por legislações nacionais que asseguram o direito à educação sem discriminação e que tivemos a oportunidade de aprendemos no Curso de Educação em Direitos Humanos e Diversidade. Ao negar ou atacar a abordagem de gênero e diversidade nas escolas, esse discurso impede que estudantes, especialmente aqueles que fazem parte da comunidade LGBTQIAPN+, do reconhecimento de suas identidades, contribuindo para a perpetuação de violências e exclusões que deveriam ser enfrentadas pelo sistema educacional e que acabam reverberando em nosso país, pois infelizmente lideramos o ranking de LGBTfobia no mundo. Desta forma, não se trata apenas de defender uma minoria vitimizada ou dar-lhe apenas visibilidade, mas de reconstruir toda uma diversidade de relações sexistas, hierarquizadas, desiguais e opressoras, que atingem toda a comunidade escolar. E Nesse sentido, como uma educadora em e para os direitos humanos quero convidar você professores e professoras a repensar suas práticas e assumir um compromisso cotidiano com a educação em direitos humanos e diversidade para que possamos atuar na desconstrução dessas falsas ideias sobre “ideologia de gênero” e as tensões e contradições vivenciadas no ambiente escolar como atitudes que levam a divisão por sexo nas aulas de Educação Física, as filas de meninos e de meninas na Educação Infantil; as distinções sexistas de vestuário que afirmam, por exemplo que meninos não usam rosa, brincos, colares, esmaltes e, também separando brincadeiras específicas para cada gênero, a forma dos/as professores/as tratarem alunos homens ou mulheres, com rispidez ou com delicadeza; tratar a violência, verbal e até mesmo física, entre meninos como algo normal, “coisa de homens” e a preocupação constante com a manifestação da sensualidade das meninas a ponto de controlar seu vestuário, além de negar o direito de meninas e meninos trans o uso do nome social.
A educação em direitos humanos exige de nós uma postura reflexiva e crítica diante dessas práticas que, muitas vezes, reproduzimos de forma automática ou naturalizada. É necessário enxergar cada uma dessas ações cotidianas como uma oportunidade de construir um ambiente escolar mais acolhedor, equitativo e respeitoso para todos e todas, independentemente de sua identidade de gênero, orientação sexual ou expressões individuais. Essa transformação não acontece de forma imediata ou isolada; pelo contrário, demanda um esforço contínuo, colaborativo e comprometido com a promoção de valores como empatia, respeito e justiça. Assim, também gostaria de te convidar a ficar atenta e atento para quando sair a nova edição do Curso de Aperfeiçoamento em “Educação em Direitos Humanos e Diversidades: educar-se e educar para a construção de uma sociedade fundamentada em direitos humanos” você possa fazer pois será uma excelente ferramenta para considerar, reconhecer e defender direitos, buscando desconstruir e romper com uma “cultura” preconceituosa e discriminatória em razão do gênero e sexualidade, bem como para o combate à misoginia, homo/transfobia, entre outras minorias presentes na sociedade brasileira. Concluo com a certeza que me move todos os dias ao entrar nas escolas que atuo, a educação tem o poder transformador de construir uma sociedade mais afetuosa, humana, justa e inclusiva. Cada pequena intervenção em nossas práticas diárias, cada estereótipo desconstruído, cada valor de empatia e respeito cultivado em sala de aula são sementes de um futuro, que se faz no agora, para todos e todas. Que possamos, como educadores e educadoras, enxergar em nossa atuação cotidiana uma oportunidade de mudança e resistir aos desafios com afeto, coragem, determinação e esperança. Convido cada um e cada uma a refletir sobre seu papel ativo nesse processo e a agir, conscientes de que juntos podemos fazer da escola um espaço de acolhimento e transformação, onde a diversidade seja celebrada e os direitos humanos, vivenciados plenamente pois todas as vidas são importantes dentro e fora do ambiente escolar.
Alinne Grazielle Neves Costa Professora de História e de Projeto de Vida na rede privada do município de Uberlândia Uberlândia, 17/12/ 2024